REVISTA SUDAMERICANA DE EDUCACIÓN, UNIVERSIDAD Y SOCIEDAD, AÑO VII, NÚMERO 7
Diálogo entre duas investigações acerca das Altas Habilidades/Superdotação: retratos da
Aprendizagem e Trajetória de sujeitos em diferentes fases da vida
Dialogue between two investigations about High Skills / Giftedness: portraits of
Learning And Trajectory of subjects in different phases of life
Leandra Costa da Costa10
Priscila Fonseca Bulhões11
Este trabalho é oriundo de um recorte teórico de duas pesquisas concluídas, sendo uma de Mestrado e outra de Doutorado, ambas na área da Educação Especial, inseridas na temática das Altas Habilidades/ Superdotação (AH/SD). Na primeira o foco foi investigar as representações de um jovem Identificado com AH/SD acerca da identidade resiliente, na segunda pesquisa o enfoque foi dado ao estudo e validação de um Instrumento direcionado à Identificação das AH/SD em idosos. Dessa forma, o objetivo principal neste trabalho foi apresentar brevemente os encaminhamentos metodológicos de cada uma das duas pesquisas no intuito de compartilhar posteriormente produções teóricas tendo como objeto a conceituação das AH/ SD bem como problematizações tangentes a adolescência e a velhice, nos idosos. Acredita-se, portanto, que os estudos dialogam entre si e defende-se a necessidade de mais pesquisas, sobretudo, comparadas entre os sujeitos com AH/SD ao longo de suas fases de vida.
This work comes from a theoretical cut of two concluded researches, one of which was a Master’s and the other was a Ph.D. investigation, both in the area of Special Education, inserted in the subject of High Abili- ties / Giftedness (HA / G). In the first one, the focus was to investigate the representations of a young person identified with HA / G on the resilient identity, in the second research the focus was given to the study and validation of an Instrument directed to the Identification of HA / G in the elderly. Thus, the main objective of this work was to briefly present the methodological guidelines of each of the two kinds of research in order to later share theoretical productions with the object of conceptualization of HA / G as well as problema- tizations tangent to adolescence and old age in the elderly. It is believed, therefore, that the studies are in
| 37
dialogue with each other and the need for more research, above all, is compared between the subjects with HA / G throughout their life stages.
38 |
O estudo científico sobre as Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD) justifica-se por duas principais razões. Uma devido à crescente, porém ainda insuficiente quantidade de pesquisas, especialmente no Brasil, acer- ca desta importante temática. Destaca-se, portanto, uma desproporção entre a demanda real por conhe- cimentos na área, necessários à pratica docente para o atendimento aos estudantes com AH/SD, e a escas- sa quantidade de subsídios teóricos encontrados na literatura acadêmico- científica. Ademais, a segunda razão, justifica-se pela conquista Legal que reconhece o estudante com AH/SD como sujeito da Educação Especial por conta de suas especificidades e de seu alto potencial.
Em consonância ao reconhecimento das Necessidades Educativas Especiais do estudante com AH/SD, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) apresenta que os estudantes com AH/SD, em qualquer nível ou modalidade de ensino, demostram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotri- cidade e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvimento com a aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse.
Contudo, segundo Mettrau e Reis (2007) apenas identificar os estudantes com AH/SD não é o bastante, tendo em vista que seu reconhecimento implica, sobretudo, em propiciar a estes um atendimento que respeite suas necessidades e que atendam adequadamente às suas demandas educacionais específicas.
Para tanto, a fim de identificar e atender as necessidades especiais do estudante com AH/SD, de forma mais efetiva, se faz necessário uma melhor compreensão dos aspectos que permeiam a construção de sua identidade. Evidentemente, não há como generalizar e afirmar a existência de uma identidade comum a todos os sujeitos com AH/SD, uma vez que os todos os indivíduos são únicos e as identidades plurais. Desse modo, cabe considerar que as identidades se constituem sob as mais variadas circunstâncias, contextos e influências.
No entanto, algumas características e/ou fatores comuns às pessoas com Altas Habilidades Superdotação (PAH/SD), podem ser apontados, reconhecendo-os como sujeitos com AH/SD à medida que estudos pre- existentes observam particularidades similares entre estas pessoas, chamando-os de “indicadores de AH/ SD”. Cabe ressaltar, que a Identidade é mutável até o final da vida, assim como algumas características das PAH/SD podem variar ao longo da vida e da trajetória individual de cada um, outras permanecerão preser- vadas da infância até velhice.
Pérez (2008, p. 124), ao se referir ao público adulto como um todo em seus estudos, elenca características como:
A consciência de si mesmo e de suas diferenças;
Sensibilidade aos problemas sociais e aos sentimentos dos outros;
Busca de soluções próprias para os problemas e a criatividade;
Capacidade desenvolvida de análise, avaliação e julgamento;
Independência de pensamento e a produção ideativa, concentração prolongada numa atividade de interesse;
Desgosto pela rotina e o gosto pelo desafio;
Habilidade em áreas específicas;
Interesse por assuntos e temas complexos, ideias novas e por várias atividades;
Precocidade na leitura e a leitura voraz;
Liderança;
Memória desenvolvida;
Pensamento abstrato; rapidez e facilidade de aprendizagem; relacionamento de informações e as- sociações entre ideias e conhecimentos;
Vocabulário avançado, rico e extenso em relação aos seus pares,
Persistência perante dificuldades inesperadas e tendência ao perfeccionismo;
Senso de humor desenvolvido;
Tendência ao isolamento; a predileção por trabalhar sozinho e por associar-se a pessoas mais ve- lhas.
O conhecimento acerca dessas características é importante uma vez que podem facilitar a visualização de AH/SD, possibilitando estabelecer relações com os comportamentos das pessoas com AH/SD. Salientando que o objetivo da identificação das AH/SD vai ao encontro do respeito a sua identidade, no âmbito familiar, escolar e social, perpassando pelo direito a uma educação condizente com suas demandas e especificida- des, prerrogativa da Inclusão.
Nesse sentido, este artigo tem o intuito de apresentar um breve recorte teórico de duas pesquisas desen- volvidas, uma no âmbito do Doutorado e outra no do Mestrado, pelas presentes autoras, na Universidade Federal de Santa Maria, sob a orientação da Professora Soraia Napoleão Freitas. Enquanto a primeira autora abordou em sua Tese a Identificação de estudantes Idosos na Universidade Federal de Santa Maria e a va- lidação de um instrumento de Identificação das AH/SD para este público, a segunda autora deste trabalho focou sua pesquisa de Dissertação na Investigação acerca da Identidade de um jovem, previamente identi- ficado com AH/SD e as representações deste adolescente acerca da identidade resiliente.
Desse modo, o presente artigo tem como objetivos principais compartilhar algumas escolhas metodoló- gicas elegidas pelas autoras em seus respectivos trabalhos de pesquisa, a fim de situar o leitor acerca de suas posturas teórico-metodológicas as quais culminaram nos respectivos resultados de tese e dissertação (BULHÕES, 2016; COSTA, 2016). Além do exposto, pretende-se apresentar uma discussão teórica acerca de aspectos relevantes da fase da adolescência bem como da fase da velhice, nos idosos, ambos embasados pela perspectiva psicanalítica. Entretanto, acredita-se que se faz pertinente também discorrer sobre os as- pectos que tangem a temática deste artigo e das supracitadas pesquisas, definindo conceitos e definições teóricas sobre as Altas Habilidades/ Superdotação.
A fim de iniciar a proposta supracitada, atendendo ao primeiro objetivo deste artigo ora mencionado, ex- põem-se que a pesquisa com o participante jovem almejou investigar a temática das Altas Habilidades/ Superdotação12 (AH/SD) utilizando como subsídios metodológicos a Fotografia e a experienciação do Cine- ma, com seus recursos de imagem e de suas narrativas audiovisuais, respectivamente. Esta investigação de mestrado teve como foco de estudo a História de Vida de um estudante jovem, previamente identificado com AH/SD, e sua representação acerca da identidade resiliente.
O projeto de pesquisa que originou a dissertação intitulada “O Cinema e a História de Vida: Representações de um Estudante com Altas Habilidades/Superdotação acerca da Identidade Resiliente” teve como obje- tivos específicos: conhecer a história de vida do estudante com AH/SD e as suas (re) significações no que concerne ao seu processo de construção de identidade; compreender como o estudante, participante da pesquisa, percebe as AH/SD no seu processo de construção de identidade; investigar como o estudante com AH/SD percebe as (im) possibilidades de seu processo de construção de identidade no que tange a resiliência, bem como quais são suas representações quanto aos aspectos que permeiam e/ou possibilitam o constructo da identidade resiliente.
Neste estudo, portanto, foi proposto a utilização de algumas obras fílmicas para suscitar e tensionar as percepções que o sujeito da pesquisa possuía sobre si mesmo. O objetivo não se fundamentou na ideia de que o cinema simplesmente cria/ inventa uma noção de entendimento da temática de pesquisa, mas sim, de que ele, em alguma medida, acaba por lançar um outro olhar sobre o conceito – para além de reiterar enunciações, eventualmente, já conhecidas na cultura.
| 39
12 Escolheu-se, empregar neste estudo, o termo “Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD) ”, sempre que o texto designar a crença das pesquisadoras. A escolha pauta-se na intenção de se estar em consonância com a terminologia adotada pela Polí- tica Nacional de Educação Especial, na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) e com os estudos que o GEPSP, grupo no qual as pesquisadoras se inserem, tem se proposto a realizar.
40 |
Nesse sentido, é verdadeiro dizer que é por meio das narrativas que as pessoas rememoram as experiên- cias, transferindo o que é do campo do individual para o campo do espaço compartilhado, construindo assim o que se chama de social. Dessa forma, o ato de contar histórias se dá de modo independente das teorias educacionais ou de competências linguísticas (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2013).
O narrador sempre inicia seus relatos apontando as circunstâncias relatadas relacionadas a ele, ou seja, atribui sentidos à história conforme a experiência da história para si mesmo. Preferindo, então dar ao fato narrado um caráter biográfico.
Nessa perspectiva, quando o sujeito se depara com as realidades expostas por meio das narrativas audiovi- suais permite-se que ele produza uma ideia de si mesmo e (re) signifique sua própria realidade, sua própria verdade. Ou seja, o cinema pode propiciar um “atravessamento” de sensações, emoções, lembranças e de- sejos que dizem a respeito do sujeito, de sua identidade os quais podem ser expressados pela linguagem.
Após a experienciação das sessões fílmicas fez-se o uso de Tópicos Guia para operacionalizar a coleta das informações, por meio da técnica da Entrevista Narrativa. As EN foram gravadas, por um discreto aparelho de gravação de áudio, com a devida permissão do participante da pesquisa. Conforme “recomendação” de Jovchelovitch e Bauer (2013) as gravações iniciais foram transcritas fielmente.
A partir da transcrição de todas as narrativas foi utilizado como método de análise a Análise de Conteúdo, proposta por Bardin (2011). As categorias foram elencadas a posteriori, ou seja, durante o transcurso da investigação.
Por sua vez, na pesquisa de Doutorado o objetivo principal do estudo foi identificar as Altas Habilidades/ Superdotação em acadêmicos idosos inseridos na educação superior da UFSM. Os objetivos específicos foram: discutir os indicadores de Altas Habilidades/Superdotação relacionados aos acadêmicos idosos; de- senvolver um instrumento que possibilite a identificação das Altas Habiliadades/Superdotação em pessoas idosas; identificar os acadêmicos idosos na educação superior da Universidade Federal de Santa Maria.
A tese defendida é a de que os idosos com Altas Habilidades/Superdotação necessitam ser identificados e reconhecidos como portadores de indicadores e características específicas para que, assim, possam rece- ber um atendimento acadêmico condizente com suas necessidades.
A opção metodológica está pautada em um estudo de caso qualitativo, tendo como referencial a aborda- gem do estudo de caso. Chizzotti (1998, p. 79) explicita que a proposta da abordagem qualitativa:
[...] parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependên- cia viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito- observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado.
Foram aplicadas entrevistas semiestruturadas, pois, de acordo com Triviños (2008, p. 146), esta, “ao mesmo tempo que valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o infor- mante alcance a liberdade e espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação”.
Dando segmento às etapas metodológicas de investigação, foi realizado contato com os acadêmicos ido- sos inseridos na UFSM e solicitado que preenchessem uma ficha com suas informações pessoais e respon- dessem a uma entrevista semiestruturada e um questionário, a fim de viabilizar a identificação e o reconhe- cimento dos idosos com Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD).
Em síntese, os instrumentos que fizeram parte do estudo foram a Ficha de Informações Pessoais (FIP) e o Questionário para Identificação de Indicadores de Altas Habilidades/Superdotação em Adultos (QIIAHS- DA), formulado por Pérez (2008), revisto em 2009 e alterado em 2011, sendo finalmente disponibilizado em Pérez e Freitas (2012). O referido questionário passou por adaptações e alterações para a estruturação do Questionário para Identificação de Indicadores de Altas Habilidades/Superdotação em Idosos (COSTA, 2016), o qual foi validado para posterior aplicação, por meio de testagem, para que finalmente fosse pos- sível sua utilização.
A Teoria dos Três Anéis, proposta pelo psicólogo estadunidense Joseph Renzulli, pode ser representada pela interseção de três anéis que se articulam entre si. Estes anéis correspondem a um grupo de traços básicos humanos, os quais correspondem, a saber: habilidade acima da média, comprometimento com a tarefa, e criatividade (RENZULLI, 2004).
Renzulli (2004) afirma que alunos que possuem pelo menos uma habilidade acima da média, em compa- ração a sua faixa etária e nível em que se encontra, e que demonstram um alto nível de energia e envolvi- mento com a atividade e tarefas de seu interesse, desenvolvendo-a de forma criativa, são as pessoas que possivelmente exibirão comportamentos de superdotação13.
Cabe destacar que o comportamento superdotado observado apenas na interseção dos anéis, conforme a figura supracitada, depende de outros fatores tais como, os de personalidade e de ordem ambiental. Ren- zulli (2004) considera, portanto, as influências do meio social de suma importância para que os componen- tes dos anéis possam ser desenvolvidos e assim, consequentemente, o sujeito possa ser melhor observado e identificado como superdotado. Esta identificação, por sua vez, teria o intuito do contexto prover meios para o seu desenvolvimento pleno.
Freitas e Pérez (2010) destacam que, a habilidade acima da média pode ser identificada somente tendo em vista as questões do contexto no qual a criança se insere, o qual seria referencial para a verificação desta.
A habilidade acima da média pode ser detectada tendo como referência um grupo homogêneo de pessoas (por exemplo, os alunos de uma mesma turma escolar), da mesma faixa etária e aproximadamente da mesma origem socioeconômica (já que as oportunidades de expressão das AH/SD estão estreitamente vinculadas ao contexto) (FREITAS, PÉREZ, 2010, p. 16).
Conforme a teoria dos três anéis os sujeitos que são capazes de apresentar a intersecção destes traços e aplicá-los a qualquer área do conhecimento, domínio e realização humana, são considerados sujeitos com AH/SD, necessitando, portanto, de atendimento educacional específico que venham a atender suas de- mandas educacionais especiais.
Conforme Renzulli (2004, 2014) o entendimento da inteligência pautado na perspectiva tradicional e psi- cométrica representa um entrave para a compreensão das AH/SD, pois para ele a superdotação pode ser dividida em duas amplas categorias. Segundo o autor, muitas habilidades não podem ser mensuradas pe- los conhecidos testes de QI e, portanto, excluiriam muitos indivíduos que possuem, inegavelmente, habili- dades superiores, mas áreas que tais testes não aferem.
Nesse sentido, apresenta-se que Renzulli (2004, 2014) compreende tanto para a identificação quanto para o desenvolvimento de comportamentos superdotados duas categorias, por ele denominadas de “superdo- tação escolar” (ou acadêmica) e “superdotação criativo-produtiva”. Para o autor a primeira categoria, corres- pondente a superdotação acadêmica, é
[...] o tipo mais facilmente mensurado pelos testes padronizados de capacidade e, desta forma, o tipo mais con- venientemente utilizado para selecionar alunos para os programas especiais. As competências que os jovens apresentam nos testes de capacidade cognitiva são exatamente os tipos de capacidades mais valorizados nas situações de aprendizagem escolar tradicional, que focalizam as habilidades analíticas em lugar das habilidades criativas ou práticas. As pesquisas têm mostrado uma elevada correlação entre a superdotação acadêmica e a probabilidade de obter notas altas na escola. Elas têm mostrado que a aprendizagem escolar (lesson learning) superior e os testes permanecem estáveis no decorrer do tempo. Estes resultados deveriam levar a algumas conclusões muito óbvias sobre a superdotação acadêmica: ela existe em graus variados; pode ser facilmente identificada através de técnicas padronizadas e informais de identificação [...] (RENZULLI, 2004, p.82).
| 41
13 O autor não utiliza a terminologia Altas Habilidades/Superdotação, por isso optou-se por manter o termo utilizado pelo autor, uma vez que (neste caso) está se discutindo a partir da perspectiva de Renzulli.
Assim, uma vez que fossem identificadas tais características e constatados os comportamentos superdota- dos14 nos estudantes, os educadores deveriam despender o máximo de investimento na adequada modifi- cação de programas curriculares aos estudantes com AH/SD, a fim de melhor atender as suas necessidades especiais.
42 |
O tempo, constituídos por intervalos, e como dito aqui metaforicamente (pela linguagem cinematográfica) como os frames, são capazes de compor e inventar diferentes fases da vida de um indivíduo.
No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069, de 1990, considera criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos e define a adolescência como a faixa etária de 12 a 18 anos de idade (arti- go 2o), e, em casos excepcionais e quando disposto na lei, o estatuto é aplicável até os 21 anos de idade (artigos 121 e 142). O adolescente pode ter o voto opcional como eleitor e cidadão a partir dos 16 anos. O conceito de menor fica subentendido para os menores de 18 anos.
A adolescência é marcada pela transição no desenvolvimento entre a infância e a vida adulta que impõe grandes mudanças físicas, cognitivas e psicossociais. Contudo, mais do que meramente uma fase de tran- sição a adolescência tem sido compreendida na sua especificidade e importância, ou seja, a adolescência é uma etapa crucial no desenvolvimento do indivíduo.
Conforme esclarece Becker (1986), a adolescência conforme suas mudanças no nível físico e corporal é marcada por características universais, com algumas importantes variações, excepcionalmente. Porém, no nível psicológico e das relações do indivíduo com o ambiente, poder-se-ia afirmar que os padrões de com- portamento são muito variáveis dependendo de cada cultura, de cada grupo social e de cada indivíduo.
Algumas características comuns dos sujeitos adolescentes poderiam ser mencionadas, dessa forma infere- se que os adolescentes se distinguem em suas especificidades, pois “nesta fase da vida, é fundamental a tarefa de firmar-se como indivíduo, ou seja, encontrar uma identidade que o diferencie dos demais” (COS- TA, 2006, p.110).
De acordo com Calligaris (2000, p.15-16), a tentativa de definir um adolescente (do gênero feminino e do masculino) perpassa pela reflexão de que
[...] há um sujeito capaz, instruído e treinado por mil caminhos – pela escola, pelos pais, pela mídia – para ado- tar os ideais da comunidade. Ele se torna um adolescente quando, apesar de seu corpo e seu espírito estarem prontos para a competição, não é reconhecido como adulto. Aprende que por volta de mais dez anos, ficará sob tutela dos adultos, preparando-se para o sexo, o amor e o trabalho, sem produzir, ganhar ou amar; ou então produzindo, ganhando e amando, só que marginalmente.
Assim, a adolescência é entendida como um tempo de suspensão, suspensão entre a chegada à maturação dos corpos e a autorização de realizar os valores sociais mais básicos.
A adolescência é uma fase, no mínimo inquieta, não seria para menos uma vez que a imposição da morató- ria supracitada, imposta pelos adultos, cria um “desconforto” nos adolescentes “recém-chegados”.
Encorajar os jovens a se tornarem indivíduos independentes é uma prerrogativa importante na educação moderna, pois em nossa cultura o sujeito é considerado adulto quando este é capaz de tornar-se autô- nomo, independente e responsável. Contudo, apesar da maturação dos corpos, na adolescência, a dita autonomia tão almejada e idealizada por todos na sociedade é reprimida e postergada para mais tarde (CALLIGARIS, 2000).
Considerando que “o negativismo, sobretudo com os pais, e o constante impulso por maior independência são traços da adolescência inicial” (BEE, 2003, p.514), é comum haver uma ruptura com dinâmica de relação que antes fora estabelecida com as pessoas do convívio do adolescente. As novas relações que se estabe-
14 Será utilizada a expressão “comportamentos superdotados” sempre que as AH/SD estiver sendo referida pela perspectiva de Renzulli, uma vez que este autor faz uso desta expressão para representar as AH/SD nos/dos sujeitos.
lecem, por vezes, são marcadas por “descompassos”, angústia e certa rebeldia por parte dos adolescentes, bem como por frustração, impaciência e ansiedade por parte dos pais e/ou professores.
Nesse sentido, concorda-se com Dolto (1990, p.18) quando ela afirma que a adolescência
[...] é uma fase de mutação. Ela é tão fundamental para o adolescente quanto são para o recém-nascido o nas- cimento e os primeiros quinze dias de vida. O nascimento é uma mutação que possibilita a passagem do feto a criança de peito e sua adaptação ao ar e à digestão. O adolescente, este, passa por uma mudança a respeito da qual não consegue falar e, para os adultos, ele é objeto de questionamento que, conforme os pais, é carregado de ansiedade ou cheio de indulgência.
No entanto, considera-se que a arte, a pesquisa e aprofundamento em áreas de interesse deste sujeito, bem como o esporte e/ou vivências sociais significativas entre os pares podem contribuir, produtivamente, para a canalização da energia criativa destes sujeitos adolescentes. Do mesmo modo, o diálogo, o respeito mú- tuo e a construção de regras coletivas claras podem facilitar a convívio e fortalecer a qualidade da dinâmica familiar e relação professor/aluno.
São muitas as mudanças que caracterizam a sociedade contemporânea, as transformações ocorrem em rit- mo acelerado, e muitas vezes, para os pais elas são “sentidas” de forma particular e diferente do sujeito ado- lescente. Compreender os efeitos da tecnologia e das novas formas de interação social, por exemplo, pode se configurar como um desafio imensurável para as gerações mais experientes. Atualmente os adolescen- tes entram em contato direto com uma gama de informações extraordinárias, principalmente em termos quantitativos, as quais antigamente não seria possível, na época, para os “adultos de hoje” acessarem.
Ao contextualizar o universo das imagens à época que vivemos e a geração atual de adolescentes, que compõem nossa sociedade, podemos citar Flusser (2008, p.15), quando afirma que:
Somos testemunhas, colaboradores e vítimas de uma revolução cultural cujo âmbito apenas adivinhamos. Um dos sintomas dessa revolução é a emergência das imagens técnicas em nosso torno. Fotografias, filmes, ima- gens de TV, de vídeo e dos terminais de computador assumem o papel de portadores de informação outrora desempenhados por textos lineares. Não mais vivenciamos, conhecemos e valorizamos o mundo graças a li- nhas escritas, mas agora graças a superfícies imaginadas.
Nesse sentido, cabe pensar de que forma que a adolescência ou adolescências de hoje estão se constituin- do, de que modo os jovens operam na sociedade e com quais recursos. Ou melhor, quais seriam os sentidos que eles atribuem aos recursos, especialmente tecnológicos, de que dispõem e que usos fazem destes?
Ao se articular as problematizações retromencionadas com as características comuns observadas nos ado- lescentes com AH/SD, tais como a criticidade, a convicções de opiniões, questionamento à autoridade, o perfeccionismo e a propensão ao aprendizado individual, solitário, torna-se ainda mais necessária a discus- são acerca dos novos modos de vida da contemporaneidade.
Nesse sentido, não há como não considerar que a tecnologia e o acesso rápido a informação e outras for- mas de comunicação podem se configurar como um modo de buscar o conhecimento muito mais atraente do que a aprendizagem escolar, sobretudo, se está estiver pautada no modelo tradicional, por uma peda- gogia diretiva.
Contudo, o adolescente pode experimentar um conflito importante em relação ao que ele quer e ao que os outros (pais, professores, colegas, etc) esperam dele.
Diante deste dilema que pode fazer parte, em graus e níveis diferentes nos distintos adolescentes, Costa (2006), embasada em Novaes, expõe que
A adolescência é, pois, um período que, além de muitas mudanças, impõe inúmeros desafios a serem enfren- tados. Um deles, certamente, é aprender a lidar com os próprios desejos e também com o desejo do outro [...]. Quando estão presentes características de altas habilidades, a marca da diferença está mais evidenciada, o que pode exigir desse adolescente maior investimento emocional para fazer frente às expectativas de seu meio. Bom suporte afetivo, compreensão, oportunidades são instrumentos essenciais para definir o grau de ajuste psíquico e emocional que o indivíduo atingirá na interação com seu contexto social (COSTA, 2006, p.115).
Portanto, é imprescindível que haja uma relação de confiança e respeito entre os adolescentes e suas figu- ras de autoridade, especialmente no caso dos adolescentes com AH/SD. É necessário que tanto os adultos
| 43
estejam abertos a dialogar, a ampliarem suas perspectivas quanto é necessário que os adolescentes expe- rimentem a empatia, a tolerância e a compreensão das limitações dos mais velhos. Almeja-se, a partir da construção de um vínculo saudável e com a relação dialógica, que a fase da adolescência seja vivenciada com o máximo de experiências produtivas, direcionando os potenciais para a produção de situações enri- quecedoras e transformadoras em prol do bem comum.
44 |
No transcurso do trabalho de pesquisa, pretendeu-se abordar o sujeito idoso dando enfoque a suas capa- cidades, fossem elas de ordem da cognição ou da emoção. Nesse sentido, a tese se propôs a compreender esta fase específica da vida humana e ressaltar, sempre que necessário ou relevante, as potencialidades e/ ou habilidades do sujeito idoso sem se deter nas, possíveis e/ou eventuais, fragilidades desse sujeito em decorrência da sua condição de idoso.
Contudo, cabe também apresentar um outro viés dessa importante fase da vida, que muitos alcançam e vivenciam em seu ciclo vital. Portanto, pretende-se, neste momento, problematizar as questões relativas às perdas, que são tanto de ordem orgânica quanto psicossocial, pelas quais passam os sujeitos idosos ao longo de suas vidas. Salienta-se que se optou por desenvolver, oportunamente, neste capítulo, apenas as questões de ordem psicossocial, utilizando para tanto, um enfoque psicanalítico para a compreensão do fenômeno.
Segundo D’Andrea (2001), o termo velhice, no seu sentido mais amplo, refere-se ao período que se inicia na década dos cinquenta anos de idade, após o indivíduo ter atingido e vivenciado uma gama de realizações pessoais, que denominamos de maturidade. Contudo, o autor alerta para o fato de que a velhice é, antes de tudo, um conceito controvertido e complexo. Assim, se considerarmos a velhice como um conjunto de ocorrências que representam um declínio global das funções físicas, intelectuais e emocionais, ela tende a ocorrer após os 70 anos, pois, em geral, apenas uma pessoa acima dessa idade possui as características que a podem definir globalmente como velha. Entre essas características, é possível citar:
O aspecto apergaminhado da pele, a atrofia muscular difusa, a fragilidade óssea, a canície, o desgaste e a queda dos dentes, a atrofia geral dos tecidos e dos órgãos, as alterações da memória, a limitação dos interesses intelec- tuais, a equanimidade, os sentimentos de saciedade dos impulsos etc. Sucede que a velhice não corresponde apenas a estes acontecimentos psicofísicos, mas envolve um complexo processo de decadência funcional que na realidade se inicia muito antes da pessoa ter qualquer noção de que está envelhecendo (D’ANDREA, 2001, p. 143).
A noção de velhice está intimamente ligada à de tempo, relação que aponta, segundo o imaginário social, muitas vezes, para um sujeito que não investe no presente nem projeta o futuro. É justamente essa negação de futuro que coloca o sujeito idoso em confronto com a morte, implicando numa decadência psicossocial.
Cabe destacar que, na sociedade ocidental hodierna, o conceito cultural do jovem em relação ao idoso está baseado numa relação de justaposição, ou seja, o que é considerado velho e decadente está posicionado, imaginariamente, em uma relação secundária em comparação ao que é jovem. Esse estado secundário se torna evidente quando o indivíduo perde seu papel central de referência, deixando de representar um lu- gar socialmente estabelecido a partir das relações de seu meio, isto é, deixando de ser procurado por seus conselhos. Essa perda ocorre de diferentes formas, dependendo, muitas vezes, da natureza do trabalho e dos valores desenvolvidos pelo sujeito em seu meio social.
Em consonância ao supracitado, D’Andrea (2001) discorre acerca das possíveis causas – conscientes ou inconscientes – do comportamento preconceituoso e segregatório adotado, comumente, pelos jovens em relação aos mais velhos. A esse respeito, o autor afirma que as relações interpessoais entre pessoas mais jovens e as de idade avançada têm várias implicações psicodinâmicas, entre as quais se pode destacar duas:
Os jovens que consideram os velhos não podendo não ter mais lugar numa sociedade de evolução rápida e intensa estão negando as contribuições que estes mesmos velhos deram a esta mesma sociedade em tempo não muito remoto e o cabedal de experiências que adquiriram e com o qual podem ainda contribuir para o progresso. Esta negação leva os primeiros a evitarem os segundos e ao temor de identificarem-se com eles. Esta distância afetiva entre as gerações, assim como a pequena co-participação das experiências dos mais velhos, provoca nos mais jovens uma ansiedade de realizarem muitas coisas para as quais só teriam condições com
mais idade. Não percebem que sua rejeição pela experiência dos mais idosos já os está predispondo, por identi- ficação, a uma posição de desconfiança em relação às gerações futuras reforçando inconscientemente sua fobia à velhice. 2) Por outro lado, os jovens observando velhos, antes produtivos, e que agora, pelo declínio físico e mental, já não realizam tanto mas, ao contrário, necessitam de cuidados, não aceitam sua posição cada vez mais dependente e desejam que eles se mantenham no mesmo nível de auto-suficiência dos anos anteriores. Esta atitude dos mais jovens é também uma defesa contra a percepção antecipada do que lhes poderá suceder na velhice (D’ANDREA, 2001, p. 144-145).
Nesta ótica de pesquisa sobre o idoso, podemos perceber o envelhecimento como um processo complexo e ambíguo, de forma que os indivíduos vão lidando com perdas físicas, sociais e psicológicas e vão adqui- rindo, ao longo de suas vidas, experiências que não se conquistam senão vivendo este processo. Assim, não só o sujeito idoso, mas todos os sujeitos sociedade contemporânea passam a ser concebidos essencialmen- te como históricos; isto é, as dimensões do tempo e da temporalidade passam a ocupar um lugar essencial. Além disso, o sujeito passa a ser representado mais do que como apenas um ser histórico, mas também como agente crucial da sua própria história.
Os diferentes tipos de rios que temos na geografia da Terra e suas partes constituintes podem ser analoga- mente relacionados à temporalidade a que o ser humano está inscrito. No que se refere aos rios, os do tipo perene são aqueles que correm durante todo o ano; os do tipo efêmero são aqueles que existem somente quando fortes chuvas acontecem, que são as chamadas torrentes; e os rios intermitentes (ou temporários) são aqueles cujos leitos secam ou congelam durante algum período do ano.
Acredita-se que o ser idoso pode caracterizar-se, simbolicamente, como qualquer um dos três tipos de rios existentes, pois a identificação com um tipo ou outro irá depender de inúmeros fatores, entre eles, os fatores externos, como os ambientais, e os internos, como os de personalidade. Os recursos internos para lidar com as circunstâncias da vida, bem como a resiliência, irão depender especificamente de cada sujeito.
Nesse sentido, entendendo a existência – e característica – da água dos rios como sendo a força da energia vital de cada sujeito idoso, pode-se inferir que essa energia de vida persiste e vigora mais intensamente em alguns sujeitos do que em outros. Algumas pessoas canalizam seus desejos de modo produtivo e buscam realizar-se plenamente, apesar das adversidades, ao longo de sua vida, ao passo que outras pessoas esmo- recem com maior facilidade e diminuem sua força motriz psíquica com o passar dos tempos, especialmente quando as perdas decorrentes da idade começam a se fazer presentes.
O processo de envelhecimento, portanto, exige uma reorganização interna e externa, de modo que o su- jeito se adapte à sua nova condição e promova estratégias capazes de superar as suas fragilidades e poten- cializar as suas possibilidades enquanto sujeito desejante. Contudo, ocorre, muitas vezes, uma desistência ou uma diminuição na vontade de planejar e, consequentemente, de atingir novas metas na sua vida. Essa situação se dá em decorrência de possível depressão ou, então, ao contrário, ocasiona o surgimento do transtorno depressivo.
Assim, o fator emocional é fundamental para a sua adaptação ao processo de envelhecimento, pois os fatores psicológicos interferem no envelhecimento e se caracterizam, muitas vezes, como solidão, aflição, dependência e medo. A solidão leva os idosos a ter pouco contato com as pessoas; a aflição ou angústia da perda de parentes próximos ou de amigos, seja por morte, seja por mudanças de local e/ou por perdas de órgãos em decorrência de doenças, afeta significativamente a qualidade de vida dos idosos. Também a dependência física ou psicossocial afeta a saúde dos idosos, levando a doenças, isolamento e mesmo falta de companhia para desenvolver atividades básicas como alimentar-se, realizar a higiene pessoal, caminhar, etc.
D’Andrea (2001), acerca do conflito psicossocial básico da velhice, considera que esse conflito se refere à integridade do ego versus desespero. Isso significa que aquelas pessoas as quais, durante o decorrer de suas vidas, tiveram experiências saudáveis na elaboração de seus conflitos, em cada fase de suas vidas, terão maiores chances de, em idade avançada, adaptarem-se melhor às mudanças pessoais e sociais derivadas da velhice. Esses sujeitos sentirão saciados seus impulsos, perceberão positivamente as circunstâncias vi- vidas possuindo, inclusive, maior tolerância às frustrações que permeiam as experiências humanas e, em consequência, terão maiores chances de se adaptar à velhice.
Contrariamente, se as fases do desenvolvimento da personalidade, que antecederam a fase da velhice, não tiverem sido vividas de forma satisfatória, a probabilidade de o sujeito idoso vivenciar situações internas e externas que o levam a uma situação de maior dependência será aumentada. Assim, o ego pouco for-
| 45
talecido para suportar essas vivências não satisfatórias na velhice, com os possíveis agravantes da falta de apoio do meio, colocará o indivíduo no polo extremo do conflito psicossocial da velhice, que corresponde ao desespero. Portanto, almeja-se que todos os sujeitos idosos possam ter a oportunidade de construir, ao longo do seu ciclo vital, uma personalidade pautada em um ego fortalecido, com boa autoestima e um autoconceito positivo.
O estudo de Santin e Borowski (2008, p. 152), ao referenciar o idoso e o princípio constitucional da dignida- de humana, conclui que:
É importante reconhecer que o envelhecimento populacional é um fenômeno social que requer a atuação posi- tiva do Estado, da sociedade e de suas instituições como forma de efetivar sua existência digna, não negá-la. O envelhecimento humano é um dos únicos fatores naturais que interligam a todos; torna-se primordial o respei- to à vida e à dignidade humana, o que é responsabilidade do poder público, mas também de todos os cidadãos.
Com base nessa exposição, pode-se afirmar que é de suma importância que sejam conhecidos os aspectos legais que amparam e asseguram os direitos e a dignidade dos idosos do nosso país, mas, acima de tudo, é necessário que toda a sociedade reconheça realmente que o envelhecimento se constitui em um fenôme- no social e, para que de fato o respeito aos seus direitos e à sua dignidade se efetive, não só o Estado deverá cumprir com sua responsabilidade, como também as instituições deverão fazer a sua parte, reconhecendo tanto as fragilidades quanto os potenciais desse público.
46 |
A educação é um campo vasto de estudos, pesquisas e práticas e seus sujeitos são tão plurais quanto as perspectivas e temáticas que as permeiam. Nesse sentido, a fim de tentar abarcar uma parcela importan- te da população que necessita impreterivelmente de uma educação inclusiva, o presente artigo almejou contribuir com a área compartilhando apenas um breve recorte de suas investigações, ambos na temática das Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD), porém com públicos de diferentes faixas etárias, um em sua trajetória de vida situada na juventude e outro na fase da velhice, enquanto sujeitos idosos.
Os resultados e desdobramentos da pesquisa de Doutorado teve o intuito de auxiliar acadêmicos e pessoas idosas a se reconhecer com indicadores e especificidades das AH/SD, visando tornar possível o processo de identificação.
Assim como os rios que só “tomam consciência” da sua natureza, da sua força motriz, no impulsionamento das águas quando chegam à desembocadura ou foz ao atingir o mar, os seres humanos, mesmo que em uma idade mais avançada, devem e têm o direito de “despertar”, de se identificar, de se reconhecer e tirar proveito das forças motrizes que movem sua vida diariamente, como a criatividade, a habilidade acima da média e o envolvimento com a tarefa, que geram efeitos em todas as áreas da vida e, principalmente, mo- vimentam de maneira considerável uma imensa quantidade de água para chegar ao MAR.
Cabe, então, retomar os objetivos a que se propôs este estudo: identificar as AH/SD em acadêmicos idosos inseridos na educação superior da Universidade Federal de Santa Maria, verificando, por meio dos dados coletados nas entrevistas, os indicadores habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e a criati- vidade, peças fundamentais que se entrelaçam e caracterizam uma pessoa com AH/SD, conforme Renzulli (2004).
O primeiro objetivo pautou-se em discutir os indicadores de AH/SD relacionados aos acadêmicos idosos, o segundo objetivo proposto consistiu em desenvolver um instrumento que possibilitasse a identifica- ção das AH/SD em pessoas idosas, o que foi estruturado por meio do Questionário para Identificação de Indicadores de Altas Habilidades/Superdotação em Adultos, projetado por Pérez (2008). O Questionário para Identificação de Indicadores de Altas Habilidades/Superdotação em Idosos (QIIAHSDI), elaborado para identificação de AH/SD em pessoas idosas, recebeu as adaptações necessárias e passou por um processo de validação, gerando subsídios suficientes e importantes para o processo de identificação deste. Já o ter- ceiro objetivo, foi identificar os acadêmicos idosos na educação superior da Universidade Federal de Santa Maria.
Muitos dos indicadores comuns encontrados nos estudos realizados com pessoas adultas citados por Pérez (2008) e Delpretto (2009) foram visualizados nos sujeitos idosos, como a curiosidade, a criatividade, a lide- rança, a persistência, o senso de humor, a autonomia e a preferência por desafios.
No que tange à pesquisa de mestrado retoma-se que ela propôs investigar a temática das AH/SD utilizando como subsídios metodológicos a Fotografia e a experienciação do Cinema, com seus recursos de imagem e de suas narrativas audiovisuais, respectivamente. Esta investigação teve como foco de estudo a História de Vida de um estudante, formalmente identificado com AH/SD, e sua representação acerca da identidade resiliente.
Os objetivos específicos foram: conhecer a história de vida do estudante com AH/SD e as suas (re) signifi- cações no que concerne ao seu processo de construção de identidade; compreender como o estudante, participante da pesquisa, percebe as AH/SD no seu processo de construção de identidade; investigar como o estudante com AH/SD percebe as (im) possibilidades de seu processo de construção de identidade no que tange a resiliência, bem como quais são suas representações quanto aos aspectos que permeiam e/ou possibilitam o constructo da identidade resiliente.
O jovem, participante da pesquisa, demostrou comprometimento e “abertura” para responder a maior par- te das questões que iam sendo postas no transcurso deste trabalho. Este fato corrobora as contribuições dos autores utilizados no referencial metodológico quando afirmam que a necessidade de narrar, de contar histórias (e sua própria) é um ato inerentemente humano.
Constatou-se que o sujeito se percebe enquanto pessoa com altas habilidades/superdotação (PAH/SD) e que não se imagina não sendo. Ele revelou que não possui muitas memórias de antes de sua identificação e acredita-se, portanto, que a identificação e atendimento precoce das AH/SD repercutem significativamente na construção da identidade da PAH/SD.
No que se refere a resiliência ele representou-a como“movimento”, o oposto da não estagnação e da não re- signação. Destacou que acredita na importância da rede social para o desenvolvimento da resiliência, mas crê que a palavra mais importante para o desenvolvimento de todos os aspectos relacionados à identidade de uma pessoa é a autoconsciência.
BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.
BECKER, D. O que é adolescência. 3.ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986. BEE, H. A criança em desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed, 2003.
BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília: Ministério da Justiça, 1990.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspec- tiva da Educação Inclusiva. MEC/SEESP, Brasília, 2008.
BULHÕES, P.F. O cinema e a História de Vida: Representações de um Estudante acerca da Identidade Resiliente.
2016. 260p. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2016.
CALLIGARIS, C. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.
CHIZZOTTI, A. Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. São Paulo: Cortez, 1998.
COSTA, M. R. N. da. Um olhar sobre o adolescente com altas habilidades. In: FREITAS, S. N. (Org). Educação e altas habilidades/superdotação: a ousadia de rever conceitos e práticas. Santa Maria: Ed. Da UFSM, 2006. p. 109-125.
COSTA, L.C. Altas habilidades/superdotação e acadêmicos idosos: Um direito à identificação. Tese. (Doutorado em Educação). Universidade Federal de Santa Maria, 2016.
D’ANDREA, F. F. O desenvolvimento da personalidade: enfoque psicodinâmico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. DELPRETTO, B. M. L. A pessoa com altas habilidades/superdotação adulta: análises do processo de escolarização
ral de Santa Maria, Santa Maria, 2009.
DOLTO, F. A causa dos adolescentes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. ERIKSON, E. H. Identidade: juventude e crise. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.
| 47
48 |
FLUSSER, V. O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São Paulo: Anablume, 2008.
FREITAS, S. N; PÉREZ, S. G. P. B. Altas habilidades/superdotação: atendimento especializado. Marília, SP: ABPEE, 2010.
. Altas Habilidades/superdotação: atendimento educacional especializado. 2. ed. revis. e ampl.Marília: ABPEE, 2012.
. Manual de identificação de altas habilidades/superdotação. Guarapuava: Apprendere, 2016. JOVCHELOVITCH, S; BAUER, M. Entrevista Narrativa. In: BAUER, M.W; GASKELL, G. (orgs.) Pesquisa qualitativa com tex-
METRAU, M. B; REIS, H. M. M. DE S. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e literatura especializada no con- texto da educação inclusiva. In: Revista Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação. v.15 n.57 Rio de Janeiro, out. /dez.2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104403620070 00400003&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 26/05/2014.
PÉREZ, S. G. B. Sobre perguntas e conceitos. In: FREITAS, S.N. Educação e Altas Habilidades/Superdotação: a ousadia de rever conceitos e práticas. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2006.
. Ser ou não ser, eis a questão: o processo de construção da identidade na pessoa com altas habilidades/su- perdotação adulta. 2008. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.
RENZULLI, J. O que é esta coisa chamada superdotação, e como a desenvolvemos? Uma retrospectiva de vinte e cinco anos. Educação. Tradução de Susana Graciela Pérez Barrera Pérez. Porto Alegre – RS, ano XXVII, n. 1, jan/abr. 2004. p. 75-131.
. A concepção de superdotação no modelo dos três anéis: um modelo de desenvolvimento para a promoção da produtividade criativa. In: VIRGOLIM, A.M.R.; KONKIEWITZ (Orgs). Altas Habilidades/superdotação, Inteligência e Criatividade: Uma Visão Multidisciplinar. Campinas, SP: Papirus, 2014. p.219- 26.
SANTIN, J. R.; BOROWSKI, M. Z. O idoso e o princípio constitucional da dignidade humana. Revista Brasileira de Ciên- cias do Envelhecimento Humano, v. 5, n. 1, p. 141-153, jan./jun. 2008.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 2008.