Considerações sobre os problemas do ensino superior: avaliação da aprendizagem e formação de professores

 

Considerations about higher education problems: evaluation of learning and teacher training

 

 

Leandro Marques Yoshizumi[1]

 

Recibido: 07/11/2021

Aprobado: 29/12/2021

Resumo

O presente artigo é resultado dos estudos de pesquisa realizado no curso de Mestrado em Educação da Facultad de Ciencias de la Educación - Universidad de la Empresa, e se insere na linha de pesquisa “Pedagogia, Currículo e Avaliação”, e cujo campo de estudo tem como tema central a avaliação da aprendizagem no Ensino Superior no Brasil. A pesquisa base desse artigo teve como objetivo verificar as percepções dos professores em relação aos processos avaliativos e suas contribuições para a formação profissional do aluno do Ensino Superior.

 

Palavras-chave: avaliação da aprendizagem, ensino superior, práticas de avaliação

 

Abstract

This article is the result of research studies carried out in the Master's in Education course at the Facultad de Ciencias de la Educación - Universidad de la Empresa, and is part of the research line “Pedagogy, Curriculum and Assessment”, and whose field of study has as a central theme the assessment of learning in Higher Education in Brazil. The research base of this article aimed to verify the perceptions of teachers in relation to evaluation processes and their contributions to the professional training of higher education students.

 

Keywords: learning assessment, university education, assessment practices.

Resumen

Este artículo es fruto de los estudios de investigación realizados en el curso de Maestría en Educación de la Facultad de Ciencias de la Educación - Universidad de la Empresa, y forma parte de la línea de investigación “Pedagogía, Currículum y Evaluación”, y cuyo campo de estudio tiene como tema central la evaluación del aprendizaje en la Educación Superior en Brasil. La base de investigación de este artículo, de carácter metodológico cualitativo, tuvo como objetivo verificar las percepciones de los docentes en relación a los procesos evaluados y sus aportes a la formación profesional de los estudiantes de educación superior.

 

Palabras clave: evaluación del aprendizaje, enseñanza superior, prácticas de evaluación.

Introdução

O tema da aprendizagem no Ensino Superior se faz essencial e de suma importância, uma vez que a educação tem um papel central na sociedade como instituição formal e de grande responsabilidade social (Nobre & Sulzart, 2018). E, apesar da normatização da educação ser meramente descritiva, é possível, no entanto, tratá-la como um elemento do contrato social, sendo uma prática exercida em sociedade (Rousseau, 1996).

Para Cunha (2018), a instituição escola tem um forte papel social e cultural e movimenta-se em decorrência dos valores e contextos que perpetuam em uma sociedade. Acontece que, para a autora, historicamente a educação escolarizada representa o papel de guardiã da cultura dominante e da transmissão do conhecimento e dos valores sociais.

Nesse sentido, portanto, a principal finalidade desse artigo é discutir sobre os atuais problemas relacionados à educação, com foco na questão no Ensino Superior. Para tanto, esse artigo traz à tona reflexões sobre as políticas neoliberais, a avaliação da aprendizagem e a formação dos professores no Ensino Superior. E, cabe pontuar ainda, que as principais referências teóricas usadas são: Roldão (2007), Giroux (1997), Zeichner (2014), Cunha (2004) e Hoffmann (2005).

 

Políticas neoliberais

Se faz necessária a discussão sobre as políticas neoliberais para compreensão dos problemas estruturais relacionados à educação, uma vez que Libâneo (2012), por exemplo, destaca que as políticas educacionais realizadas por meio do Banco Mundial para os países em desenvolvimento evidenciam os traços da escola dualista – separando os ricos e os pobres, e assim trazendo à tona contextos neoliberalistas importantes de serem considerados.

Libâneo (2012) reflete acerca das contradições mal resolvidas entre as questões das quantidades e das qualidades das escolas em relação ao direito delas, ou seja, apenas ter direito à escolarização, não basta para ponderarmos os aspectos quanti e quali dessa questão que abrange outros aspectos, por exemplo tanto os pedagógicos como socioculturais.

Dessa forma, o que temos é a contraposição da visão de escola que se apoia no conhecimento, e outra em missões sociais. Para o autor, no campo educacional não estabelece um consenso mínimo sobre os objetivos e as funções da escola pública na sociedade brasileira atual.

Considerando essa falta de consenso, então, é importante trazer para pano da reflexão as considerações sobre as reformas educativas iniciadas na Inglaterra nos anos de 1980, atreladas ao contexto das políticas neoliberais e em consonância com os acordos internacionais em torno do movimento Educação para Todos, que teve como marco a Conferência Mundial sobre Educação para Todos - Jomtien.

Foi nesse sentindo, também, que as políticas educacionais de outros países se transformaram em cartilhas para o Brasil no que diz respeito à elaboração de planos de educação do governo federal e de governos estaduais e municipais. Sendo que tais ações incidiram tanto nas políticas de financiamento, como no currículo, na formação de professores, na organização da escola e nas práticas de avaliação da aprendizagem.

Tramando essas conexões, entendemos justamente a finalidade do texto do Libâneo (2012) que é a de, justamente, apontar as ligações entre as proposições originadas na Conferência Mundial sobre Educação para Todos (1990) e as políticas públicas para a Educação Básica realizadas nos últimos vinte anos pelos governos brasileiros.

No Brasil, o primeiro documento que resultou de uma ordem de imposição relativa às reformas na educação, que seguia recomendações dos organismos internacionais, foi o Plano Decenal de Educação para todos (1993–2003). Esse documento foi elaborado durante o governo Itamar Franco, e depois, nas sequências governamentais, tais políticas continuaram presente no governo Fernando Henrique Cardoso e no governo Lula.

Foi então, também tomando essas questões e contexto que Libâneo (2012) estabeleceu a noção de escola dualista. Na qual temos: por um lado, a escola para os filhos dos ricos volta-se ao conhecimento, à aprendizagem e às tecnologias; e por outro lado, uma escola voltada para os filhos dos pobres, que somente aborda o acolhimento social, a integração social e que está, principalmente, voltada às missões sociais de assistência e apoio às crianças.

Portanto, essa escola dual, desconsidera uma formação cultural e científica com práticas socioculturais nas quais se façam presentes as diferenças, os valores e as formas de conhecimento locais e cotidianos. O que vai em contraposição à necessidade e indicação de que a ação pedagógica deve assegurar, como princípio, a universalidade da cultura escolar – fatos que acabam não acontecendo no contexto dual.

Também, faz-se necessário destacar as considerações de Libâneo (2012) sobre as políticas educativas baseadas em planos globais definidos pelos organismos internacionais para os países pobres. Para Libâneo (2012), as políticas do Banco Mundial para as escolas mais pobres revelam duas características pedagógicas principais: o atendimento às necessidades mínimas de aprendizagem; e o espaço de convivência e acolhimento social. Dessa forma, podemos compreender que as políticas educacionais promovidas pelos organismos internacionais voltam-se para uma “educação para a reestruturação capitalista” ou “educação para a sociabilidade capitalista” (Libâneo, 2012, p. 20).

Acontece que as reformas neoliberais se configuram em modificações profundas na sociedade. Trata-se de uma nova formulação do capitalismo, sobretudo com ações práticas permeadas por fatores ligados a um contexto globalizado, imerso em grandes e intensas reformas internacionais que tiveram como foco a redução de custos financeiros e de políticas sociais, baseadas nos pressupostos de produtividade, eficiência e eficácia (Maués, 2014).

As políticas neoliberais atingem todos os aspectos da docência, desde as facetas correspondentes às relações de emprego até a estrutura disponível para a atuação de sua função, conduzindo para um processo de precarização e intensificação do trabalho (Oliveira, 2004). Portanto, é importante entender o contexto estabelecido por meio de questões políticas, para que se possa compreender as relações estabelecidas na sala de aula.

 

Formação de professor: reflexão, criticidade e rupturas

Para abordamos a questão da formação de professores, trazemos à tona, então as considerações de Roldão (2007), Giroux (1997) e Zeichner (2014) sobre a especificidade profissional do professor e, também, a discussão sobre o campo de formação de professores e suas possibilidades de mudança.

Roldão (2007) discorre acerca da natureza da função específica do professor, que está ligada principalmente ao conhecimento profissional docente. A história dos professores em sua constituição como grupo profissional (ou mesmo pré ou semiprofissional) desenvolveu-se num processo complexo de profissionalização, que está ligado à institucionalização da escola e à afirmação de um conhecimento profissional específico (Roldão, 2007). Uma construção histórico-social marcada por lutas e disputas.

Nas sociedades atuais, a função de ensinar pode ser caracterizada por meio da figura da dupla transitividade e pelo lugar de mediação. O ensino configura-se como a especificidade de fazer aprender alguma coisa a alguém – o que chamamos de currículo, e o ato de ensinar somente se concretiza nessa segunda transitividade corporizada no destinatário da ação. O que por um lado gera contradições e tensões, e por outro é a centralidade do conhecimento profissional.

Assim, Roldão (2007) define um conjunto de cinco características necessárias para o conhecimento profissional docente. A primeira é a natureza compósita, ou seja, ser capaz de transformar os conteúdos científicos em conteúdos pedagógicos-didáticos em uma ação transformativa – não apenas uma mera aplicação. Para isso, é necessária a apropriação mútua dos tipos de conhecimentos envolvidos. Pode-se destacar como um elemento central do conhecimento profissional docente a capacidade de mútua incorporação, coerente e transformadora de um conjunto de componentes do conhecimento em conhecimento transformativo.

A segunda característica é a capacidade analítica: 

O conhecimento profissional (do professor, do médico, entre outros) exige sem dúvida o rigoroso domínio de muito saber técnico (como fazer) e o domínio de uma componente improvisativa e criadora ante o “caso”, a “situação”, que podemos chamar de “artística”. Mas só se converte em conhecimento profissional quando, e se, sobre tais valências (técnica e criativa) se exerce o poder conceptualizador de uma análise sustentada em conhecimentos formalizados e/ou experienciais, que permite dar e identificar sentidos, rentabilizar ou ampliar potencialidades de ação diante da situação com que o profissional se confronta (Roldão, 2007, p. 100).

O terceiro item refere-se à natureza mobilizadora e interrogativa. Em todo o processo de ensinar é necessário um questionamento permanente da sua prática. O conhecimento profissional docente é marcado pela singularidade e imprevisibilidade das situações e das pessoas, ou seja, necessita de questionamento constante, tanto da ação prática como do conhecimento previamente adquirido e da experiência anterior.

O quarto ponto é a meta-análise, a postura de distanciamento da situação e a autocrítica do processo. Ela é necessária para uma prática reflexiva, juntamente com o conhecimento formal, didático e de conteúdos, que constituem o saber docente.

A última característica é a comunicabilidade e a circulação, ou seja, um saber articulado e sistemático. De forma, que o conhecimento seja passível de comunicação, transmissão e discussão para os outros.

Para Roldão (2007), o saber profissional docente deve ser construído no princípio da teorização anterior e posterior, sendo de extrema importância a discussão da ação profissional docente, que se liga permanentemente à questão da formação. Diante disso, o professor deve saber ensinar, a partir de um processo de mediação com um sólido saber científico e, também um domínio técnico e didático, tendo a necessidade da realização da meta-análise, para um processo contínuo e permanente de questionamento intelectual de sua ação e prática.            

Já Giroux (1997), busca compreender uma visão alternativa da atividade docente como categoria de professores com intelectuais transformadores. A partir de muitos movimentos de reforma educacional se têm um apelo por mudanças na área da educação, mas que para os professores pode ser tanto uma ameaça como um desafio produtivo.  Sendo que, no caso da ameaça, ela vem por meio de uma série de reformas educacionais que demostram pouca confiança na capacidade dos professores da escola pública de oferecerem uma liderança intelectual e moral.

Muitas reformas acabam por afastar os professores da realidade cotidiana, e isso acarreta o enquadramento da categoria em “status de técnicos de alto nível cumprindo ditames e objetivos decididos por especialistas um tanto afastados da realidade cotidiana da vida em sala de aula” (Giroux, 1997, p. 157).

Giroux (1997) alerta que as reformas na educação não levam em conta o papel que o professor tem no debate, desconsiderando a sua voz nas proposições. Para o autor, as reformas e recomendações que não dão vozes aos professores fracassam. Ademais, elas ignoram a inteligência, o julgamento e a experiência que os professores poderiam proporcionar na formulação do ensino e no debate pedagógico.

O autor propõe que os professores se unam ao debate público com seus críticos, e que vejam nisso uma oportunidade de se engajarem em um processo de autocrítica em relação à natureza e à finalidade dos programas de formação de professores, do seu trabalho e das formas dominantes de escolarização. Para Giroux (1997), o engajamento é necessário para melhorar suas condições de trabalho e pode permitir a reforma das escolas públicas.

Assim, Giroux (1997) define que o engajamento é uma alternativa para repensar e reestruturar a natureza da atividade docente considerando os professores como intelectuais transformadores. Nesse sentido, Zeichner (2014) elenca grandes contribuições para se pensar no campo da formação de professores, partindo de pesquisas que investiguem diferentes abordagens de formação de professores e a elaboração de modelos de formação que correspondam aos princípios de justiça social.

Zeichner (2014) destaca a necessidade do trabalho em conjunto acontecido entre a universidade, a escola, as comunidades locais e os movimentos sociais, para que ocorra o enfrentamento das políticas conservadoras de educação e da estrutura de desigualdades sociais presentes na sociedade.

A defesa do autor é pautada em uma educação crítico-emancipatória, com os pressupostos da luta por uma sociedade mais justa, como forma de superação das opressões e cuja qualidade educativa se estabeleça juntamente com a atuação dos professores e sua formação.

Zeichener (2014) destaca, ainda e, portanto, a necessidade de também olhar para as questões relativa às condições de trabalho dos docentes, como a remuneração e a falta de acesso ao desenvolvimento profissional de qualidade. Dessa forma, ressalta-se a necessidade de investimento de recursos adequados para todas as escolas públicas. Uma vez que o fortalecimento no ensino público precisa ser considerado para o benefício de toda a sociedade e seu valor precisa ser reconhecido.

Portanto, para que ocorra mudanças nas escolas e na formação de professores, os problemas descritos acima devem ser considerados de forma mais ampla, para além das questões educacionais, ou seja, precisam ser considerados na perspectiva da redistribuição de recursos na sociedade como um todo.

Não há como olhar a educação de maneira isolada, sem tratar das desigualdades sociais. Além disso, importa considerar que as universidades não podem realizar todas as mudanças sozinhas. Temos reveladas, assim, a importância de um trabalho conjunto, que estabeleça relações entre a universidade, a escola, as comunidades locais e os movimentos sociais. Para Zeichener (2014), a formação de professores deve ter uma estrutura híbrida, em que a responsabilidade seja compartilhada pela universidade, a escola, a comunidade local e os movimentos sociais.

Diante disso, é necessário refletir sobre a forma como o professor realiza a avaliação da aprendizagem. Considerando que no modelo tradicional de educação, o melhor professor era aquele com maior conhecimento sobre seu campo de estudo, enquanto o melhor aluno era aquele cujas respostas mais se aproximavam da fonte autorizada – o professor, temos então que a fidedignidade entre a fonte e o receptor era o parâmetro que definia o sucesso do ensino.

Souza (2012) revela que nessa escola a avaliação da aprendizagem se dava de forma disciplinadora, tendo como base a catequese, por meio da qual as principais finalidades eram a domesticação e a docilização. 

O instrumento do ato avaliativo por excelência era a prova na sua forma oral e/ou escrita, individual, feita exclusivamente pelo professor sempre de maneira pontual. Essa avaliação tinha como propósito classificar e selecionar o aluno (Souza, 2012, p. 242).

Para Roldão (2007), o modelo tradicional de educação adota uma postura do professor transmissivo, ou seja, o sujeito é somente um professor que transmite um saber. Neste sentido, e complementarmente, o aluno tem uma postura só de receber o conhecimento, de modo que não há então uma relação dialética entre professor e aluno. 

Infelizmente, essa realidade ainda se faz muito presente na escola e na universidade da atualidade. Podemos observar isso, por exemplo, nas práticas cotidianas envolvendo avaliações que exigem que o aluno decore o conteúdo, a partir de repetições incansáveis de exercícios de fixação mecânica e por meio de aulas expositivas, com o foco na projeção do conteúdo para o aluno copiar (Cunha, 2018).

No Ensino Superior brasileiro, essas questões também são realidades presentes. Conforme, podemos destacar nas palavras da autora:

Ainda se convive com práticas cotidianas que confirmam essa realidade: avaliações que exigem “decoreba”; repetições de incansáveis exercícios de fixação da aprendizagem de forma mecânica; aulas expositivas com uma única metodologia de ensino; uso de power points – que sucederam as lâminas de retroprojetor e os slides – com conteúdo tácito para os alunos copiarem e memorizarem; punição objetiva ou simbólica de todas as manifestações que discordem da palavra do professor; inibição da partilha do conhecimento e de tantas outras manifestações tão comuns no cenário acadêmico (Cunha, 2018, p. 7).  

Chaves (2004) teve como objeto de estudo as concepções e as práticas de avaliação da aprendizagem dos professores no Ensino Superior e suas repercussões na sala de aula do ponto de vista dos alunos, constatando que, na maioria das vezes, existe uma ausência de critérios de avaliação dos estudantes pelo grupo de professores de uma mesma disciplina.

Para Chaves (2004), no Ensino Superior, a maioria dos professores ainda mantêm uma prática de avaliação tradicional, 

Basicamente utilizando provas escritas para verificar a retenção dos conhecimentos repassados, não servindo para orientar ou reorientar o aluno, para situá-lo frente as exigências da disciplina e do curso e do papel que os conteúdos de cada disciplina tem na sua formação profissional. (Chaves, 2004, p. 4) 

A autora destaca ainda que temos uma situação complexa nas aulas, pois muitos professores somente cumprem as exigências legais da instituição, ou seja, de lecionar as aulas, avaliar e atribuir uma nota. Já o aluno por sua vez, na maioria das vezes, está mais preocupado em passar na disciplina e conseguir notas do que com a qualidade da sua formação profissional, e então acaba por se submeter passivamente ao ensino engessado e sem reflexão sobre sua prática.

Souza (2012) afirma que nas universidades ainda predominam práticas de avaliações tradicionais e menos as práticas transformadoras. Diante disso, esse artigo teve como objetivo abordar a avaliação e a aprendizagem dos alunos no Ensino Superior, com o intuito de buscar compreender os aspectos do ensino “padronizado”, por meio do qual acreditamos não haver a percepção das reais necessidades e dificuldades do aluno.

Cunha (2018) ressalta que grande parte dos professores do Ensino Superior se intitulam como professores, mas sem nunca terem tido uma formação apropriada para isso. Dessa forma, é possível verificar que a falta de capacitação profissional dos docentes levanta a necessidade de repensar a dinâmica entre professor e aluno, principalmente, no que diz respeito às práticas de avaliação.

Nesse sentido também, Gatti (2010) evidencia o quanto a formação de professores no Brasil é fragmentada, sendo necessária uma revolução nas estruturas das instituições formativas e nos currículos das universidades. De forma que a educação vigente hoje não atende a função social da escolarização, e o que se tem é a formação de professores dividida em campos disciplinares, sem o olhar para a formação docente de maneira a contemplar as reais necessidades educacionais e as demandas sociais. 

 

Formação dos professores universitários

A formação dos professores universitários, diferentemente das outras etapas de ensino, segue a lógica popular do “quem sabe fazer, sabe ensinar”. Dessa maneira, na universidade, esse professor tem como base de formação a profissão que exerce ou exercia no mundo do trabalho, não sendo um educador por formação.

Aqui, o pressuposto científico assume um papel significativamente maior do que o conhecimento pedagógico na escolha dos docentes (Cunha, 2004). O que pode incorrer no desconhecimento ou na falta de ferramentas pedagógicas para, sem ter formação como educador, lidar com o fato de que sua explicação clara pode não desencadear a mesma compreensão para todos os alunos, visto que o entendimento ocorre de acordo com as vivências anteriores e experiências de situações singulares de cada aluno (Hoffmann, 2005).

O pedagogo atua, nesse contexto de definição “do que” ou “como” é ensinado na universidade, como mero coadjuvante, apenas legitimando o que foi definido dentro das corporações, a fim de dar forma discursiva aos documentos (planos curriculares, projetos pedagógicos, processos avaliativos), para que transitem nos órgãos oficiais (Cunha, 2004).

Percebe-se, então, que a pedagogia universitária ainda carece de legitimação para o professor do Ensino Superior, especialmente diante das políticas públicas que tratam da formação do professor universitário. Entretanto, só o seu reconhecimento como campo científico e profissional fará essa ciência avançar à condição desejada, respondendo às demandas e exigências da universidade no século XXI (Cunha, 2018).

 

Materiais e métodos

Esse artigo, derivado dos estudos de projeto de pesquisa de mestrado, teve como finalidade analisar os problemas relacionados à docência no Ensino Superior no Brasil, buscando identificar qual é a concepção de educação dos professores nos cursos de graduação, ou seja, verificar se é uma concepção mais tradicional ou mais libertadora.

Utilizamos a abordagem qualitativa que considera as questões subjetivas, sendo capaz de identificar e analisar dados não mensurados numericamente. A investigação qualitativa dispõe de uma grande variedade de métodos específicos, cada um com seus propósitos e premissas particulares (Flick, 2004).

O conhecimento vindo das reflexões e das pesquisas científicas deve ser construído numa temporalidade histórica constituída nas relações sociais concretas, selecionando aspectos de produção no processo de disseminação, apropriação e consolidação. Então, a trajetória da pesquisa de campo educacional tem que estar em consonância com ada conjuntura histórica (Gatti, 2002). As características da investigação qualitativa devem se pautar em quem se estuda, nas particularidades do método e na meta de investigação. Além disso, o contexto, os processos e a visão de mundo devem ser considerados. 

O processo de investigação qualitativa supõe a imersão na vida cotidiana da situação selecionada para o estudo, a avaliação e as tentativas de descobrir a perspectiva dos participantes sobre seus próprios mundos e considera a investigação como um processo de interação entre o investigador e os participantes.

Nessa investigação, o local do estudo foi a universidade. Tendo em vista que a universidade, como instituição, está cheia de complexidade, já que a sua base é construída no seio das instituições sociais, e sendo composta por indivíduos que contribuem para a continuidade dela.

 Na perspectiva de romper com a racionalidade técnica, a universidade é objeto de inovações que almeja uma nova configuração de saberes. A possibilidade de interação entre saberes científicos e populares, racionalizando as relações entre teoria e prática, torna-se fundamental - especialmente no contexto de políticas públicas de avaliação institucional, que privilegiam a lógica da produtividade, sem valorizar a diferença e sua condição de transformação (Cunha, 2004).

Na década de 1990, iniciou-se no Brasil a inserção das políticas públicas neoliberais, e nesse contexto Draibe (1993) evidenciou que o neoliberalismo é uma ideologia dominante, composta por proposições práticas a governos e reformas do Estado, que “reinventam” o liberalismo. Destaca-se que os sistemas educativos foram extremamente afetados pelas políticas neoliberais, a partir da perspectiva da racionalidade e ajuste estrutural (Maués, 2014). Para Maués (2014), foi possível verificar a interferência de organismos internacionais na definição das políticas educacionais, e dessa forma, o sistema educacional dispôs das demandas do mercado.

É importante destacar que as políticas públicas de avaliação institucional tiveram início, no Brasil[2], durante a década de 1990, quando tanto os órgãos de financiamento internacional quanto nacional exerceram uma forte pressão sobre o Estado para que tornasse o Ensino Superior autossustentável (Didrikson, 2004). Souza (2012) define que as avalições de sistema têm como função a “atenção em sistema de ensino com o propósito de subsidiar políticas públicas na área educacional” (Souza, 2012, p. 233).

No entanto, as funções do Estado no controle e supervisão das universidades mostram que o uso da avaliação como um medidor qualificado não traz por si só a força das mudanças, mas atua enquanto um instrumento de controle que pode carregar o redesenho capitalista da universidade (Leite, 2002). Assim, os programas de avaliação de larga escala não têm incidido no melhoramento das instituições, porque seu objetivo final é justificar o gasto público, uma vez que não tem como finalidade melhorar os aspectos do processo de qualidade do Ensino Superior (Didrikson, 2004).

Sousa (2012), ao analisar a literatura da avaliação da aprendizagem no contexto universitário em salas de aula demonstra que as práticas avaliativas das universidades têm se dado de forma autoritária

Os estudos são reveladores do quanto muitas das práticas avaliativas na universidade têm se dado de forma autoritária com o devido respaldo da instituição, uma vez que esta tem se furtado a discutir essa questão, deixando-a ao critério de cada professor, muitos dos quais, sem nenhum estudo ou mesmo interesse sobre o tema, adotam com seus alunos procedimentos iguais ou semelhantes aos que foram submetidos quando alunos (Souza, 2012, p. 251).

Para esse artigo, fez-se necessário então discutir sobre a função social da universidade que desenvolve possibilidades para contribuir com a solução de grandes problemas estruturais relacionados à educação, à saúde, à alimentação, ao meio ambiente e à pobreza, tornando possível uma maior articulação entre a produção acadêmica e os requerimentos da sociedade e da produção capitalista.

Nesse sentido, deve-se trabalhar para o desenvolvimento de estruturas interdisciplinares e de modelos pedagógicos sustentados na criação de habilidades, capacidades e competências, e na produção e transferência de conhecimentos e tecnologias (Didrikson, 2004).

Sendo assim, o objetivo de uma escola que segue a teoria construtivista , em que considera como parte do processo de aprendizagem a inteligência do sujeito e sua interação com o meio, é trabalhar por uma educação significativa, de qualidade, para todos os alunos do país, e não os classificar e excluí-los como ocorre no paradigma tradicional (Hoffmann, 2005).

Leão (1999) destaca que o ensino tradicional pretende transmitir os conhecimentos acumulados historicamente na humanidade, sem levar em consideração os saberes prévios dos alunos. Na escola tradicional, o professor é quem domina os conteúdos organizados e estruturados para serem transmitidos aos alunos. Diante disso, os estudos desse artigo tinham por finalidade analisar as concepções existentes nas práticas de avaliação do Ensino Superior. 

Estudos recentes, dentre os quais se destacam Sousa (2012) e Hoffmann, (2005), demonstram que se deve deslocar o foco do “ensinar” para o “aprender”. Isto é, a atividade básica deve estar voltada para o estudante. Neste sentido, a avaliação passa a ser vista como um processo e não como um resultado (Trevelin & Neiva, 2011). Não é estático o papel da educação no contexto social e suas funções se alteram na medida das transformações (Cunha, 2018).

É importante compreender que a partir da década de 1960 iniciou-se a expansão de matrículas nos sistemas de educação superior em diversos países, e esses geraram a disseminação de instituições de ensino que atuam em condições inadequadas de infraestrutura e recursos humanos, e cujos projetos curriculares nem sempre atendem às demandas da sociedade para a produção e difusão do conhecimento (Peixoto, 2010, p. 670). Dessa forma, tem-se a expansão do Ensino Superior sem a qualidade adequada e sem atender efetivamente às demandas sociais necessárias.

Com relação à avaliação do Ensino Superior, de acordo com Peixoto (2010), esse processo se inicia a partir da década de 1990. Em 14 de abril de 2004, tem-se um marco com a aprovação da Lei nº. 10.861, que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES).

No cenário educacional fica evidente que o Ensino Superior está inserido em uma lógica de mercado, fortalecendo a concepção de avaliação do trabalho escolar,

Uma concepção de avaliação do trabalho escolar que tem na verificação de desempenhos em testes o seu foco, ao deslocar a discussão da produção da qualidade do ensino do âmbito político/público para o âmbito técnico/individual, tende a ativar mecanismos que estimulem a competição entre escolas e redes de ensino (Sousa, 1997, 110). 

Entende-se então que a função do Ensino Superior passa a ser colaborar com o crescimento da economia e preparar os indivíduos para o mercado de trabalho, tendo duas palavras-chaves associadas a tal ideia: empregabilidade e eficiência. Por isso, diante desse cenário em que a universidade está inserida, esse artigo aponta a necessidade de repensar o ensino e a avaliação no Ensino Superior.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 por meio do artigo 207 define o princípio de indissociabilidade do Ensino Superior no país, que se dá por meio de três pilares: ensino, pesquisa e extensão (Brasil, 1988). Sendo (i) a educação, como o processo cotidiano de aprendizagem, e aqui discutido, enquanto a oferta do conteúdo disciplina e processos avaliativos; (ii) a pesquisa como o momento do aluno, então assumindo o papel de pesquisador, que passa a aprofundar seu conhecimento em relação aos temas específicos e propor melhoramentos aos métodos e aos processos pesquisados; e finalmente (iii) a extensão, como o momento para se colocar em prática o conhecimento adquirido e desenvolvido ao longo deste processo, testando hipóteses, experimentando possibilidades de atuação e adequando as percepções de acordo com a experiência da prática.

Diante disso, o objetivo é que os três pilares da universidade atuem de maneira integrada, quando bem realizado e articulado, permitindo que o processo de ensino e aprendizagem seja colocado em prática de forma cotidiana e impedindo que processos avaliativos sejam baseados em etapas passivas, mas pelo contrário, possibilitem ao aluno questionar, testar e experimentar os conhecimentos adquiridos de forma prática em diferentes formas de atuação de sua prática profissional, podendo assim, por exemplo, utilizar o conhecimento do ensino em projetos de extensão.

Nesse sentido, portanto, é que o presente artigo pretende contribuir: analisar os processos avaliativos e as práticas de avaliação em cursos de graduação, tendo como intuito verificar as concepções de ensino dos docentes nas faculdades e, assim, oferecer elementos para o desenvolvimento da área de avaliação no Ensino Superior, colaborando para a melhoria das práticas avaliativas dos professores. 

 

Resultados

Os estudos de Sousa (2005) e Sousa (2012) evidenciam que, no Brasil, são escassas as discussões sobre avaliação da aprendizagem no Ensino Superior. Percebe-se que a preocupação da maioria dos estudos reside no caráter “da operacionalização das políticas públicas e da dimensão técnica da avaliação” (Sousa, 2005, p. 482).

Nos estudos, pode-se observar as incorporações do entendimento do processo avaliativo, em detrimento à problematização da formação pedagógica adequada. Fato esse que reflete diretamente nas metodologias avaliativas aplicadas pelos professores universitários (Garcia, 2009).

Os professores utilizam práticas de avaliações tradicionais, o que torna o processo avaliativo dos estudantes sem efetivo significado e acabam desconsiderando algumas dimensões importantes da aprendizagem. Destaca-se que os professores do Ensino Superior não têm obrigatoriedade de possuírem uma formação específica para atuarem como docentes nas faculdades (Cunha, 2018).

A avaliação é intrínseca ao processo de ensino (Souza, 2012). Ainda de acordo com o autor, as práticas avaliativas mais presentes dentro da escola demonstram a seletividade e a discriminação impostas pelo contexto social mais amplo, dessa forma, a avaliação cumpre uma função burocrática e discriminatória.

É preciso ter clareza do processo avaliativo e dos tipos de avaliações, pois cada avaliação tem uma função específica, que pode ser utilizada em diferentes momentos do processo educativo (Freitas & Costa & Miranda, 2014).

É nesse sentido, portanto, que a problemática central desse artigo demonstra a necessidade de analisar com mais profundidade a forma como a relação ensino e aprendizagem é inserida no Ensino Superior e, consequentemente, a necessidade de repensar a atual dinâmica proposta em sala de aula nas faculdades, que ainda prioriza o professor sendo o transmissor do conhecimento e não o mediador da aprendizagem (Sousa, 2012).  

           

Referências

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 Didriksson, A. (set./dez. 2004). La universidad desde su futuro. Rev Pro-Posições, 15(3), 45, set.-dez.

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[1] Assessor Técnico Educacional, Cotia, Sao Paulo, Brasil. lemayo@hotmail.com  

[2] O Programa de Avaliação Institucional (PAIUB) foi instituído em 1993 pelo Ministério da Educação (MEC). Destaca-se que   em 1996, com a finalidade de verificar os conhecimentos e as competências adquiridas dos alunos em fase de conclusão dos cursos de graduação o MEC institui o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), que ficou conhecido como Provão, além disso, tivemos outros mecanismos avaliativos, com objetivo de equalizar as Instituições de Ensino Superior (IES) em termos de qualidade que, no entanto, não atendeu aos objetivos.